domingo, 31 de agosto de 2008

Sou 50% de tí, mas 1000% por tu.

Olá

Não me recordo de ter sido expelido de tí
Não me recordo da correria que aconteceu
Não me recordo de ter chegado a frente
Não me recordo
De ter adentrado naquela grande esfera

Não me recordo de ter iniciado
A transformação
Lembro-me que perdi meu rabo
E entrei de cabeça

Foi muito doido
Percebi que novas energias me quebravam
Me dilaceravam
Eu mesmo e minha forma ovulada
Me dilacerei

Passei a de forma poli-traumática
A me reestruturar
Passei a sugar aquela energia
Passei a ter noção de sentimento

Passei a perceber o tempo
Passei a perceber o calor
Passei a perceber as formas

Passei a ter formas

Passei a querer mais espaços
Passei a me incomodar com o espaço
Passei a querer ver outras coisas

Tive meu primeiro momento de stress
Tive meu primeiro momento de rebeldia
Fui anárquico
Levantei meus pés com forças
Em direção àquela porta
Em direção ao mundo

Não havia cadeados
Não havia repressão
Não havia militares
Era uma tarde
15H00 e mais alguns minutos
Era 01 de Agosto de 1961

Forcei a barra
Tive uma ajuda
Alguém ainda me puchou de forma brusca
Desconheço quem seja

A temperatura ficou mais fria
Estava nú

Me bateram
Apanhei pela primeira vez
Não tinha idéia que iria apanhar
Mas aconteceu

Chorei...chorei com força...
Não esperava isso

Conheci as luzes
Pois vivia em um mundo escuro
Denso e aguado

Conheci o cotonete
Conheci a inspiração
A aspiração

Colocaram-me em meu primeiro roupão
Quente e felpudo

Me levaram para o meu primeiro banho

Lembro-me
Alguem cortou meu prato de comida
Senti meu primeiro corte
Minha primeira cirurgia
Fiquei sem saber
Se ia comer

Recordo-me
Que ao ver as primeira luzes
Embaçadas
Fortes
Elas eram estonteantes
Não me deixavam abrir
Os olhos

Após o primeiro contato com a água
Pura e cristalina
Me ameaçaram

Levaram-me
Novamente em direção aquela porta
Senti algo
Diferente
Achei que iam me recolher
Àquele mundo aquático

Relaxei

Tenho impressão
Que ao sair pela porta
Alguém gritava
Estéricamente
Neuróticamente
Avassaladoramente
De olhos fechados

Eu ví suas feições
Ví seu sofrimento
Ví que era uma mulher
Ví que seus olhos
Estavam abertos
Ví que de forma muito rápida
Quase instintiva
Olharam para mim

E eu captei aquele olhar

Tenho ele na memória
Se é pode-se chamar
Que tinha e o que era
Naquele momento

Mas aqueles seres
Todos com roupões diferentes
Não me colocaram de novo
Naquele porta

Me levaram para aquela pessoa
Aquele olhar
Aquele ícone de ligação
Aquele despertar de intimidade
Aquele momento
De plena certeza
De plena confiaça

A minha primeira impressão
Do que é ter confiança

E aí tudo mudou
Aquela mulher
Me abriu o roupão
Voltei a ficar nú

Pela primeira vez senti frio

Mas no momento seguinte
Ela me abraçou
Me aconchegou
Me levou para bem perto
Recebi meu primeiro beijo
Ouvi pela primeira vez

Aquela mulher me disse
"FILHO
Este é meu FILHO"

Recebi os primeiros carinhos
Ela me levou ao seu colo
Recebi minha primeira refeição
Aguada e branca

Soube depois
Que àquilo davam o nome de leite
Suguei até me enfastiar
Estava ficando sonolento
Me tiraram daquele colo
Me fizeram pela primeira vez
Soltar sons desconhecidos
Disseram que era arroto

Bebí demais aquilo
Coloquei o excesso pra fora
Riram de mim

Pela primeira vez
Riram de mim
Por causa disso chorei
Queria dormir
E eles riam de mim

Devolveram-me
Para aquele colo quente
E ouvi
Pela primeira vez
Uma canção de ninar

Dormi

Depois acordei
Estava em uma jaula
Pela primeira vez
Me senti um animal

Ví que alguem me olhava
Era um homem
Era forte e altura mediana
Era diferente
Tinha cor escura
Só tinha visto gente clara

Percebi pela primeira vez
A diferença das cores

Alguém se aproximou da jaula
E ouvi uma palavra desconhecida
Era berço
Essa mesma pessoa
Olhava pra mim e dizia
Olha lá seu pai

Descobri que aquele negro
Que chorava
Postado atráz da parede transparente
Me dirigia energias positivas

Somente pude abraçá-lo
Bom tempo depois
Disseram um dia
Conheci a referência do tempo

Não era tão carinhoso
Quanto o primeiro colo
Mas ao ser abraçado
Conheci a sua força
Senti o seu agrado
Senti que era também seu filho
Mesmo ele falando isso

Recebi seu primeiro beijo

Chorei.........
Por que estava com fome

Foi meu primeiro contato
Com aquilo que conheci
Como minha família

Tempos depois
Muito tempo depois
Soube
Que era daquele homem
Que tinha sido expelido
E fora dele
Que tive a oportunidade
De achar
Aquele grande ovo
Do qual hoje sou testemunha
De que a vida existe

De que o amor existe
De que MEU PAI
Forneceu metade
De que MINHA MÃE
Forneceu a outra metade
Mas que sem ele
Sem meu PAI
Eu nada seria

Portanto ele
É tudo
E a tudo
A Ele
Ofereço essa lembrança

Obrigado PAPAI
por você ter me gerado.

2 comentários:

BIA disse...

Grande poeta!

Você deve ser muito novinho, quando eu nasci, há meio século, se já havia cotonete, na minha aldeia era desconhecido!

Adorei acompanhar o seu nascimento!

Abraço terno

BIA

Noslen ed azuos disse...

Bela viagem; percorri-a com muita emoção.

ns